28 de Julho de 2009 às 09:52

Bradesco quer alcançar o Itaú Unibanco

Diminuir progressivamente a distância em relação ao Itaú Unibanco é a determinação que o presidente do conselho de administração do Bradesco, Lázaro de Mello Brandão, deu a seus comandados. Brandão sabe que essa não é uma tarefa de curto prazo, mas é firme a respeito: "Se a estratégia não der certo, precisaremos apertar mais".


"Fomos líderes por décadas. Para conforto interno dizemos que a liderança foi tomada pela soma de dois players", confidenciou Brandão ao Valor.


A distância mais significativa é a do total de ativos, conta em que o Itaú Unibanco supera o Bradesco em R$ 137 bilhões. Mas, na carteira de crédito, a diferença cai para R$ 66 bilhões; e, em depósito, para R$ 33 bilhões.


Brandão conta como armas a tecnologia de ponta e a ampla presença do banco no mercado. O Bradesco está em 93% dos municípios brasileiros, com 3,3 mil agências, 2 mil postos bancários, 6 mil pontos do Banco Postal, além de 20 mil correspondentes. Em algumas áreas, como seguros e consórcios, o Bradesco mantém a liderança.


As aquisições não estão descartas, mas a opção é considerada remota em vista da falta de alternativas. O Bradesco acaba de comprar o Banco ibi, que custou R$ 1,4 bilhão e praticamente dobrou sua carteira de cartões. "Situações como essa são poucas. Quando aparecem, agarramos. É questão de oportunidade."


Para ele, a economia internacional ainda está em fase de ajuste e enfrenta desafios fiscais e o desemprego. Mas o quadro econômico interno é cada vez mais favorável. Nem as eleições presidenciais em 2010 devem tumultuar o cenário e Brandão espera um crescimento de 4% do PIB no próximo ano.


Quanto aos juros, a expectativa é de uma longa pausa na tendência de baixa, depois do corte de meio ponto da semana passada, que levou a taxa Selic para 8,75% ao ano.


Brandão culpou a gestão "destrambelhada" e a "alavancagem exagerada" dos bancos internacionais pela crise mundial; e disse que a saída passa por mudanças na regulamentação do setor financeiro. Já os bancos brasileiros comportaram-se bem porque a "lição de casa" foi feita quando os programas Proer e Proes, da década de 90, limparam os bancos dos ativos pobres e graças à atuação do Banco Central (BC).


O fato de o sistema financeiro estatal dominar 40% do mercado também ajudou porque essas instituições contam com o respaldo do governo. Brandão só contesta quando os bancos estatais são privilegiados, como na compra de instituições estaduais.


Aos 83 anos completados no mês passado, Brandão mantém a rotina de 12 horas diárias de trabalho. Metódico, chega invariavelmente antes das 7 horas. "Chegar depois das 7 horas fere a rotina", afirmou. As férias são de dois períodos de 15 dias cada um no ano. Mas Brandão se afasta com dificuldades do trabalho. "Longe do banco, me sinto como um peixe fora d'água." Brandão atribui a carga de trabalho ao fato de o "banco ser muito centralizador. É necessário afinar as coisas logo cedo". Já de manhã quer saber o impacto das manchetes dos jornais na vida da instituição. No fim de semana, a tarefa acumula.


Brandão trabalha no Bradesco antes mesmo de ele ter sido criado e antes do lendário Amador Aguiar, que levou o banco a ser líder do mercado. Em setembro de 1942, Brandão foi contratado pela Casa Bancária Almeida e Cia., de empresários de Marília, que foi transformada no Bradesco em março de 1943. Em agosto de 1943, chegou ao Bradesco Amador Aguiar.


A seguir, a entrevista:


Valor: Pode haver mais cortes na taxa Selic neste ano?

Lázaro de Mello Brandão: A sinalização do Banco Central é que haverá uma pausa durante um bom período. O Banco Central precisa esperar as coisas assentaram e está preocupado com o impacto da redução do juro na inflação. No passado, achávamos que o BC estava até atrasado. No momento, a prudência recomenda mais cautela.


Valor: Por quê?

Brandão: A economia ainda está em fase de ajuste em função da desaceleração causada pelos problemas internacionais. O PIB de vários países recuou; o do Brasil pode ficar neutro, o que é positivo nas condições atuais. A fase ainda é de cuidados extremos.


Valor: Mas o pior não passou?

Brandão: Há uma tranquilidade maior, isso é indiscutível. Mas ainda pode haver um mergulho, segundo alguns especialistas, especialmente nos Estados Unidos e na Europa. Há problemas fiscais e de desemprego nesses mercados com prováveis repercussões por aqui.


Valor: Qual a culpa dos bancos na crise?

Brandão: O sistema financeiro internacional teve um papel crucial no desencadeamento da crise. A gestão destrambelhada e a alavancagem exagerada desestabilizaram tudo. O governo é que teve de reequilibrar o sistema financeiro. Quando hesitou como no caso do Lehman e não fez o aporte esperado, de uma hora para a outra um banco excepcional abriu o bico. No caso da AIG, uma das maiores seguradoras do mundo, o governo nem pestanejou, teve que intervir porque os reflexos locais e internacionais seriam de grande repercussão.


Valor: A lição foi aprendida?

Brandão: O governo agiu prontamente. Uma nova regulamentação é necessária para evitar a reprodução do fato.


Valor: O que precisa ser feito em termos de regulamentação?

Brandão: Para começar, os bancos precisam ter ativos mais sadios. E a alavancagem precisa ser reduzida com a capitalização ou uma readequação para proporções mais equilibradas. No Brasil, a alavancagem vai de seis a oito vezes o patrimônio total; lá fora, houve casos de índices de até 40 vezes.


Valor: Como o Brasil se comportou na crise?

Brandão: O Brasil fez a lição de casa no passado. Na década de 90, o Proer e o Proes eliminaram os ativos podres dos bancos. Alguns ficaram pelo caminho. Paralelamente, o governo fortaleceu o sistema criando, por exemplo, compulsórios muito superiores aos do resto do mundo, que deram suporte ao sistema agora, no período de estreitamento da liquidez. O governo liberou apenas parte dos compulsórios e não precisou injetar recursos públicos.


Valor: Os bancos brasileiros reagiram melhor?

Brandão: Sim, o sistema financeiro se resguardou para qualquer contingência e respondeu prontamente. Assim, não precisou de recursos públicos como em outros países. A inadimplência aumentou mas não está desestabilizando o sistema. O crescimento do crédito pode chegar a 15% neste ano.


Valor: O que garantiu a solidez dos bancos brasileiros?

Brandão: Um ponto que ajudou foi a baixa imobilização dos bancos. O índice de imobilização chegou a 90% do patrimônio no Brasil na época em que o crédito era mais acanhado e o governo queria estimular a participação dos bancos na privatização. O governo exigiu em um período curto que o índice caísse a 50%. O Bradesco, que tinha entrado nas privatizações fazendo investimentos de maturação longa como a Vale e a CPFL, teve até que fazer uma cisão para se ajustar, criando a Bradespar.


Valor: Os bancos públicos também ajudaram?

Brandão: De fato, como parte preponderante do sistema financeiro brasileiro é público, como a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil, e esses bancos podem contar com aporte do Tesouro e têm fontes de funding como FAT e Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), eles também ajudaram no ajuste. Os bancos estatais, que representam 40% do sistema, tiveram força suficiente para sustentar o sistema.


Valor: Como o senhor vê o uso pelo governo dos bancos estatais?

Brandão: Quando o governo conduz a questão de maneira técnica não faço críticas. O problema é quando entram ingredientes políticos, porque eles desequilibram as forças.


Valor: Em quais circunstâncias o ingrediente político entra em cena?

Brandão: Para começar em licitações de bancos estaduais. No passado, o próprio Bradesco arrematou vários bancos estaduais. Agora, a política mudou ao trazer para a alçada federal os bancos estaduais. Foi o que aconteceu com o Banco do Estado de Santa Catarina e com a Nossa Caixa e pode acontecer com o Banco Regional de Brasília. A aquisição dos bancos estaduais passou a ser privativa do Banco do Brasil, o que lhe deu uma situação privilegiada. Mas ele também deu lances na área privada como no caso do Banco Votorantim. O BB é um grande banco e tem o engajamento do governo.


Valor: E quando o governo usa o banco público para reduzir os juros ou as tarifas?

Brandão: Aí é diferente porque o governo não está privilegiando o banco público quando o leva a reduzir tarifas. Incentivar a redução dos juros faz parte desses ajustes progressivos que o governo faz, também na área de tarifas ou na regulamentação do cartão de crédito. O problema é quando há desequilíbrio de forças.


Valor: O BB ainda é o principal concorrente do Bradesco?

Brandão: Isso era antes da fusão do Itaú com o Unibanco. Agora esses dois juntos assumiram a liderança e o BB se sentiu ferido e veio a público dizer declaradamente que vai buscar o primeiro lugar. A concorrência também aumentou com a fusão do Santander com o Real.


Valor: E o Bradesco, como fica nesse cenário de competição?

Brandão: Fomos líderes por décadas. Para nosso conforto, dizemos que a liderança foi tomada pela soma de dois players, não porque um cresceu ou recuamos. Mas temos que respeitar o que realizaram. Nosso esforço agora é ter qualidade e produtividade para, progressivamente, diminuir essa diferença. Não é honesto nem ponderado dizer que vamos alcançá-los ou ultrapassá-los. Isso está afastado como objetivo a curto prazo. Mas, ano a ano, temos que diminuir a diferença.


Valor: E como diminuir a distância entre os bancos?

Brandão: Por meio da produtividade e da qualidade de serviço. Hoje em dia, a área de tecnologia de informação tem um papel fundamental. Temos feito investimentos enormes e a presença geográfica nos dá condições de ganhar terreno. Estamos em 93% dos municípios brasileiros. Além do Banco Postal, temos postos avançados onde nem há Correio. Temos 3,3 mil agências, 2 mil postos bancários, 6 mil pontos do Banco Postal, além de 20 mil correspondentes. Temos 20 milhões de correntistas e 20 milhões de contas poupança. Em algumas áreas continuamos líderes. Temos um quarto do mercado de seguros, bem à frente do Itaú Unibanco. Somos líderes também em consórcios.


Valor: Aquisições podem ajudar?

Brandão: Não estão descartadas, mas essa é uma opção mais remota porque não há nada muito previsível no horizonte. Acabamos de comprar o Banco ibi, um caso um pouco isolado, que nos dará presença em 170 lojas e agregará uma carteira de cartão importante na competição. Situações como essa são poucas. Quando aparecem, agarramos. É questão de oportunidade.


Valor: Qual é a estratégia?

Brandão: É diminuir a distância progressivamente. Se não alcançarmos esse objetivo temos que rever a estratégia e apertar um pouco mais


Valor: Como vê o Bradesco em cinco anos?

Brandão: A população vai aumentar e certamente a força de trabalho vai apresentar resultados. O banco vai crescer, capturando os clientes novos e os que vão se formalizar. Neste ano, reduzimos o ritmo de abertura de agências em função da contenção de despesas. De 200 abertas em 2008, serão apenas 100 neste ano. Não recuamos, mas o timing é diferente. Se a economia melhorar, vamos aumentar.


Valor: A fusão do Itaú com o Unibanco teve influência na sucessão do Bradesco?

Brandão: Não, o estatuto não permitia a manutenção de Márcio Cypriano na presidência porque atingiu a idade limite de 65 anos para cargo executivo. Sempre dissemos que o estatuto seria cumprido, muito antes da fusão. Uma mudança de estatuto poderia ter suas razões mas ela tira o estímulo para os executivos porque o banco funciona com o sistema de carreira fechada. A sucessão cria oportunidade para outros ascenderem. Quando a presidência muda, um elenco todo se reformula, se recicla. Isso tem que ser preservado. Mudar o estatuto nunca foi cogitado, apesar das especulações da imprensa. A ideia sempre foi acatar o estatuto e manter o processo de arejamento.


Valor: E a atuação no mercado internacional?

Brandão: O banco sempre focou o campo inquestionável do mercado interno. No exterior temos alguns pontos de apoio em Nova York, Luxemburgo, Ilhas Cayman e Buenos Aires. Mas a gente acha que tem que dominar o mercado interno. O mercado externo não é prioridade. O Banco Espírito Santo (BES) quer levar o Bradesco para Portugal, mercado que tem um atrativo relativo mas é uma porta para a Europa. Ainda avaliamos com reserva esse assunto.


Valor: As eleições podem perturbar o ano de 2010?

Brandão: Não porque não haverá grandes solavancos políticos. Prevalece o PT ou vem outro partido. Alternância é própria da democracia. Não há razão para tumultuar o curso. A democracia vai se consolidando com a alternância. Se a escolha recair em alguém que queira tumultuar, a democracia se defende, tem poder para se defender. Esperamos um crescimento de 4% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2010.


Fonte: Maria Christina Carvalho/ Valor Online

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