Quando esteve em São Paulo, em 31 de outubro, para anunciar o plano estratégico para 2008 a 2010, o presidente mundial do grupo espanhol Santander, Emilio Botín, afirmou que queria que seu banco fosse o número um entre os de capital privado do mercado brasileiro.
Três dias depois, o Itaú e o Unibanco anunciaram a fusão que criou o maior banco do país e um dos 20 maiores do mundo em valor de mercado e a meta de Botín ficou um pouco mais distante.
Mas isso não impressiona o presidente do Santander Brasil, Fábio Barbosa. “Nosso objetivo é ser o melhor entre os grandes, ter escala para ser competitivo e ser o número um em retorno para o acionista. Temos uma longa jornada pela frente”, disse Barbosa, reconhecendo que a união do Itaú com o Unibanco criou um gigante que efetivamente impõe novos desafios.
O Santander já passou por isso. Quando comprou o Banespa, em 2000, subiu do oitavo para o quinto lugar do mercado em ativos totais. Alguns anos e algumas aquisições de concorrentes depois, em 2007, recuou para o sétimo lugar. Com a compra do Real, abocanhou o quarto lugar.
Apesar de não ser o maior do mercado brasileiro, o Santander conta com a retaguarda global do grupo, o sétimo maior do mundo em valor de mercado, vantagem da qual Barbosa quer tirar proveito. “Fazendo parte de um grupo internacional, podemos apoiar as empresas brasileiras em todas suas necessidades e temos tecnologias e produtos que podem ser replicados no Brasil”, afirmou.
Barbosa assumiu o comando do grupo Santander Brasil em fevereiro, em uma decisão surpreendente do banco espanhol. Foi o caso raro em que o presidente do banco comprado assumiu o comando do banco comprador. Ele presidia o ABN AMRO Real desde agosto de 1996. Em 2007, Santander, Fortis e Royal Bank of Scotland adquiriram o ABN AMRO e dividiram suas operações entre si, em uma das maiores operações de aquisição do mercado financeiro, antes do estouro da crise financeira.
É consenso no mercado que o Santander foi o que se deu melhor. Tanto é que o banco acabou de anunciar, no fim da primeira quinzena de dezembro, o aumento de 50% das linhas de comércio exterior para o Brasil, que cresceram US$ 2 bilhões, para US$ 6 bilhões, em várias modalidades e com prazo de até 360 dias.
“O Brasil deu sinais de força em meio à crise no sistema financeiro internacional e essa decisão reafirma o nosso compromisso com nossos clientes e com o País”, disse Barbosa, na ocasião. E, agora, lembra o presidente mundial do grupo, Emilio Botín, que disse que o “Brasil é peça-chave para o futuro do grupo e parte relevante do crescimento”. O reforço das linhas, acrescentou, tem como objetivo apoiar as exportações e importações da empresas que fazem parte da base de clientes do grupo Santander Brasil, que compreende o Real e o Santander. O Santander está presente em 40 países.
O processo de fusão no Brasil demorou para começar porque a aprovação da aquisição pelo banco central holandês atrasou. Era esperada para o primeiro trimestre e saiu apenas no segundo. Somente então foi possível começar a integrar as operações.
Apesar do atraso, já operam juntas todas as áreas como tesouraria, riscos, finanças, administração de recursos de terceiros, marketing e recursos humanos.
Em sua primeira entrevista exclusiva sobre o grupo Santander Brasil desde a vinda de Botín e antes de sair para duas semanas de férias no Marrocos, Barbosa revelou que a fusão das duas operações está toda concluída, tanto na parte da gestão como da direção, com apenas uma exceção, mas a mais visível de todas - a da rede de agências e de máquinas de auto-atendimento, que continuará operando separadamente até que todos os sistemas estejam integrados, o que está previsto para 2010.
“Temos duas bases de clientes, duas marcas e diferentes ofertas de produtos. O Real tem o cheque especial sem juros, o Santander, tem o cartão sem custos”, disse Barbosa, ressaltando que a convergir isso tudo é uma fase que depende basicamente da área da tecnologia da informação, e deve ser conduzida com cuidado para evitar a perda de clientes. Ela está dentro do cronograma mas só deve ser concluída em 2010.
Quem está cuidando dessa tarefa é José Paiva Ferreira, que presidia o Banco Santander Brasil e agora faz parte do comitê executivo. Quando isso ocorrer será então possível unificar a oferta de produtos e a marca, que será Santander. Até lá o banco continuará usando as duas marcas.
O novo comitê executivo do banco é formado por oito membros além de Barbosa. Quatro vieram do Santander e são, além de Paiva Ferreira, Angel Oscar Agallano, Carlos Alberto López Galán e Oscar Rodriguez Herrero. Os outros quatro vieram do Real: José de Menezes Berenguer Neto, Gustavo José Costa Roxo da Fonseca, João Roberto Gonçalves Teixeira e Pedro Paulo Longuini. A escolha buscou as melhores pessoas em suas áreas, além da familiaridade com o estilo da matriz.
Uma das maiores curiosidades do mercado é como está sendo a integração cultural da equipe do Real com a do Santander, uma vez que o sentimento é que os dois bancos são muito diferentes desse ponto de vista.
Barbosa concorda mas diz que seu objetivo é combinar os atributos dos dois bancos em uma terceira cultura, somando a “agressividade comercial” e a inovação em produtos e serviços do Santander com a ênfase do Real no relacionamento com clientes e a preocupação com a “sustentabilidade”.
O Santander reuniu, em 4 de dezembro, 4 mil funcionários de todo o Brasil para uma convenção. O resultado foi positivo. “O processo de incertezas de junho e julho já passou; e agora o grupo passa por um momento especial de mobilização”, disse.
Barbosa mantém ainda o blog que lançou quando o Real foi comprado, porque o considera “uma ferramenta importante de comunicação”.
A integração será facilitada quando o banco se mudar para o prédio novo, perto da marginal do rio Pinheiro, no segundo trimestre de 2009. O grupo ficará então distribuído em apenas dois prédios, o novo e o localizado em Santo Amaro, e não mais pelos seis atuais. O prédio da avenida Paulista, sede tradicional do Real, será “disponibilizado”, disse Barbosa.
O Santander fechou o terceiro trimestre com ativos totais de R$ 133,4 bilhões, R$ 139,2 bilhões de captações totais, que incluem recursos de terceiros administrados - R$ 46,9 bilhões em depósitos e R$ 53,8 bilhões em fundos de investimentos. São 8,5 milhões de clientes e uma rede de mais de 2 mil pontos de venda, entre agências e postos de atendimento.
Quando lançou as metas para as operações brasileiras, no final de outubro, Botín anunciou a intenção de aumentar a participação no mercado brasileiro dos 10% a 11% atuais, conforme o produto, para 15%, dobrar o lucro líquido até 2010 e sair do terceiro para o primeiro lugar entre os bancos privados. Botín afirmou que quer obter um lucro líquido no Brasil, em 2010, de R$ 7,9 bilhões. Isso significa dobrar os resultados obtidos nos primeiros nove meses deste ano de R$ 3,8 bilhões pelas regras contábeis espanholas (R$ 2,23 bilhões pelas regras brasileiras, que se diferencia em alguns pontos como contabilização de venda de papéis e compra de folha de pagamentos). Pelas regras espanholas, a meta deste ano é lucrar R$ 4,8 bilhões; e, para 2009, R$ 6,1 bilhões.
O presidente mundial do Santander também anunciou o investimento de R$ 2,5 bilhões nos próximos três anos. O Santander já investiu US$ 36 bilhões na América Latina, dos quais 75% no Brasil, ou US$ 27 bilhões, incluindo a compra do Banco Real.
Barbosa está otimista. Disse que “o Brasil está lidando bem com a crise”. Sinal disso é que terá crescimento em 2009 enquanto os países mais maduros enfrentam recessão. Disse ainda que o Brasil tem “margem de manobra para atenuar o desenvolvimento da crise”. Entre essas armas citou a retomada de planos de investimento, incentivos fiscais, reservas para atenuar a falta de dólar e a taxa de juros.
Segundo ele, o Santander Brasil não fez “nenhuma restrição de crédito no varejo”. Notou que houve uma migração do financiamento de veículos para cartões, por exemplo. No caso da pessoa jurídica, houve uma mudança de perfil, com empresas que captavam no exterior buscando recursos domésticos, o que congestionou inicialmente o mercado.
Maria Christina Carvalho, do Valor Econômico