5 de Maio de 2017 às 10:30
Retrocesso
Passados alguns dias da aprovação da reforma trabalhista pela Câmara, deputados federais já se preparam para apreciar outro projeto que reduz direitos, desta vez dos trabalhadores do campo. O PL 6442/2016, de autoria do presidente da bancada ruralista Nilson Leitão (PSDB-MT), está sendo apontados por especialistas e dirigentes de entidades de defesa dos trabalhadores como a legalização da escravidão no meio rural.
O projeto permite que as empresas substituam salários por “remuneração de qualquer espécie”, o que significa na prática que os trabalhadores poderão ser pagos com, por exemplo, comida e moradia. Prevê ainda que a jornada seja ampliada para 12 horas por “motivos de força maior”; que os empregadores substituam o repouso semanal dos funcionários por um período contínuo, com até 18 dias de trabalho seguidos; e que os trabalhadores que moram no local de trabalho vendam integralmente suas férias.
Volta ao século 19 – O presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores Assalariados Rurais (Contar), Antônio Lucas Filho, destaca
que a possibilidade da "remuneração em qualquer espécie" ao trabalhador rural é um retrocesso de mais de um século. "O cara pode receber coisas que não são salário em troca do salário. É a volta ao século 19, uma época em que o trabalhador trabalhava na fazenda em troca de uma roupa usada, de uma botina ou da comida. Um período muito ruim que já passamos na história, e que a gente quer esquecer."
O diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Clemente Ganz Lúcio, concorda que o PL é um retrocesso: "Indica claramente que partes da nossa elite, do setor empresarial, ainda acredita que a escravidão ou práticas semelhantes a ela são pertinentes para realizarmos a produção econômica."
Ele ressalta que o projeto promove "acintosa precarização" para os trabalhadores do campo e institui o escambo. "São concepções de sociedade que buscam reduzir o padrão civilizatório. É importante que possamos ter atitude frontalmente contrária a esse tipo de iniciativa. Visam a transformar em lei as péssimas condições de trabalho e a precarização", diz Clemente, em comentário à Rádio Brasil Atual.
Negociado prevalece – O PL 6.442 segue os mesmo princípios da reforma trabalhista, que agora será apreciada pelo Senado. Ele também prevê a prevalência do negociado sobre o legislado, ou seja, acordos entre patrões e empregados podem prevalecer sobre a legislação.
"Querem deixar o meio rural sem lei. Tudo passa a ser negociado entre patrão e empregado. Imagina uma empresa pequena, com cerca de 50 empregados, você falar para o empregador que você quer negociar. Ele simplesmente vai dizer 'se não querem trabalhar do jeito que está, vão-se embora que eu pego outros'", interpreta o presidente da Contar.
"Não é negociação mais, é barganha. Na barganha, o trabalhador sempre perdeu. Aonde o trabalhador conseguir fazer um movimento mais forte, conseguirão alguma coisa. Aonde não puder fazer, vão levar pancada. Vão ser oprimidos. É o caos no campo", ressaltou.
Segurança e saúde – Outra medida grave é a revogação da norma regulamentadora do Ministério do Trabalho específica para segurança e saúde no campo, a chamada NR-31. Lucas Filho lembra que essa é a conquista histórica para os trabalhadores rurais, que antes eram submetidos a normas de segurança do trabalhador urbano.
Os trabalhadores assalariados rurais pretendem dialogar, durante esta semana, com os demais deputados para mostrar o "não" ao projeto de Leitão e querem envolver o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira.
Fonte: SEEB/São Paulo
Link: https://seebcgms.org.br/noticia/reforma-trabalhista-do-campo-legaliza-escravidao/