17 de Janeiro de 2009 às 20:26

Valor: crise muda atividade bancária, diz estudo

As perspectivas do setor financeiro global no curto prazo serão caracterizadas por crescente regulamentação, retorno à atividade tradicional na área bancária, reestruturação de firmas alternativas de investimentos e emergência de uma nova categoria de ganhadores e perdedores. A avaliação é do Fórum Mundial de Economia, num relatório analisando implicações da crise sobre o setor, após anos de crescimento excepcional graças a políticas monetárias expansionistas, desregulamentação financeira e utilização excessiva de crédito.
 
O estudo do fórum ilustra a explosão de débitos durante os 20 anos que conduziram à dramática crise financeira iniciada em meados de 2007. Ilustra com a situação dos Estados Unidos, onde o total de créditos pulou de 160% do Produto Interno Bruto em 1980 para mais de 350% no ano passado.
 
Esse endividamento coincidiu com o forte declínio nas taxas de juros. Firmas alternativas de investimentos, como hedge funds e “private equity”, aproveitaram a alavancagem barata e o forte apetite por risco para acumular ativos que passaram de US$ 1,8 trilhão em 2003 para US$ 4 trilhões no final de 2007.
 
A globalização dos mercados financeiros e o crescimento das economias emergentes precipitaram também uma grande reestruturação na paisagem de investimentos institucionais. Globalmente, o controle estrangeiro de ativos financeiros alcançou US$ 67 trilhões no começo de 2008, representando um terço dos ativos totais do setor, comparado a US$ 17 trilhões uma década antes.
 
Para o fórum, a crise atual marca o início de um novo capítulo para o sistema financeiro marcado por três mudanças principais. Primeiro, a enorme desalavancagem dos bancos os deixará com menos oportunidades de financiamentos e investimentos atrativos. O aperto nos padrões de crédito e a maior aversão ao risco vão dificultar os empresários a financiar suas operações, resultando em mais perdas e falências. E isso terá impacto no valor dos ativos dos bancos, forçando mais busca de capital e contração do crédito. Segundo, o volume das perdas do setor e a conexão entre as instituições globais levarão os governos a impor maior regulamentação. As instituições financeiras serão forçadas a ter mais capital contra seus ativos. Isso vai intensificar a concorrência por depósitos, com os bancos procurando recursos mais baratos.
 
Terceiro, haverá um retrocesso na globalização financeira, que até agora tinha diversificado portfólio e aumentado os ganhos. A desaceleração econômica global já provocou uma queda nos fluxos de capitais e de comércio internacional.
 
Para o fórum, essas mudanças terão profundas implicações sobretudo em quatro áreas. A primeira é que maior regulamentação global vai cortar o crescimento em muitas instituições financeiras. O sistema financeiro poderá ser dividido em duas categorias: financeiras “'utilitárias'” e as financeiras que assumem mais risco. Como “'utilitários”, os bancos poderão se tornar mais parecidas a empresas de saneamento e água, por exemplo. Enfrentarão exigências de liquidez mais elevados. E os investidores verão essas instituições mais pela garantia do “cash flow'” do que por crescimento de ganhos.
 
Além disso, após terem perdido quase US$ 1 trilhão na atual crise, os bancos comerciais e regionais voltarão a se focar nas atividades onde são mais competitivos. O fórum prevê também mais consolidação no curto prazo. A terceira implicação será nas firmas alternativas de investimentos. A desalavancagem vai provocar alteração nos modelos de hedge funds e reavaliação das estratégias de “private equity”.
 
A crise já afeta duramente os “hedge funds”. Os ativos sob gestão, de US$ 1,9 trilhão no segundo trimestre de 2008, podem cair 40% este ano. Cerca de mil hedge funds já fecharam as portas e o numero deve chegar a quatro mil até o final de 2009.
 
Por sua vez, companhias de private equity serão pressionadas a procurar novo equilíbrio entre oportunidades e riscos. Atualmente, US$ 800 bilhões já comprometidos não foram ainda investidos.
 
O fórum prevê, nesse cenário, mais espaço, por exemplo, para “family offices”, que geram a riqueza e investimentos de uma ou mais famílias ricas. Uma pesquisa mostrou que 83 desses escritórios nos EUA têm US$ 334 bilhões sob gestão e estão bem posicionados para atuar como investidos de longo prazo em ativos subavaliados.
 
Para o fórum, os vencedores da nova paisagem financeira global serão as instituições que entraram na crise com balanços mais fortes. E os perdedores são obviamente aqueles com maior exposição ao crédito e mais riscos de liquidez. O relatório faz também projeções sobre o longo prazo, como a criação de três pólos financeiros regionais até 2020: América do Norte, Europa e Ásia.
 
Assis Moreira, de Genebra, para o Valor Econômico
 

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